Mudanças no auxílio-doença propostas pelo INSS podem trazer prejuízos
À primeira vista, tudo seria melhor e mais rápido. O trabalhador com casos de doenças ou acidentes, com afastamento de até 60 dias, poderia ter o benefício concedido pelo INSS sem perícia médica. Para quem espera meses na fila pelo atendimento, a nova proposta da Previdência Social aparentemente seria a solução. Mas o que parece ser facilidade pode gerar problemas ainda mais graves.
O alerta é feito pelo secretário de Saúde do Trabalhador da Contraf-CUT , Walcir Previtale. "Somos contra o projeto apresentado pelo INSS porque deve colaborar para o aumento da subnotificação dos acidentes e doenças do trabalho, uma vez que a proposta facilita a concessão dos benefícios previdenciários e dificulta, e muito, a concessão dos benefícios acidentários, quando dispensa o trabalhador de perícia médica somente para os casos chamados de doença comum".
Projeto interministerial
Além da Previdência Social, os ministérios do Trabalho e Emprego, Assistência Social e Saúde também analisam o projeto. Pela proposta, o tempo de afastamento seria determinado pelo tipo de doença ou gravidade do caso. O atestado médico fornecido por qualquer médico que tenha assistido o trabalhador, seja da rede pública ou da rede privada, servindo de prova para o INSS conceder o benefício.
De acordo com o INSS, um dos objetivos é descentralizar a concessão do auxílio-doença das mãos dos peritos médicos e dar mais rapidez para o recebimento do benefício.
Falhas na nova concessão
Mas as possíveis mudanças na concessão do benefício não geram preocupação apenas para as entidades que representam os trabalhadores, como a Contraf-CUT. Pesquisadores da área da saúde também têm se posicionado contrários às propostas do INSS.
A médica do trabalho e pesquisadora da Fundacentro, Maria Maeno, acompanha a discussão desde 2005, quando o assunto entrou na pauta da 3ª Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador, que aconteceu em Brasília. Em conjunto com outros profissionais, a profissional levantou diversos problemas que poderiam prejudicar os beneficiários, como falhas no processo de recuperação do trabalhador.
"Menos segurados seriam encaminhados à reabilitação profissional do que atualmente e o sistema informatizado não teria condições de avaliar a pertinência desse encaminhamento. Como agravante, nos casos em que as condições de trabalho tivessem sido determinantes para o adoecimento, ao retornar à empresa a tendência seria a piora do quadro clínico do trabalhador e muitas vezes de forma irreversível", afirma Maeno.
Impactos na CAT
O Anuário Estatístico de Acidentes do Trabalho de 2012, divulgado pelo Ministério da Previdência Social, revela que foram registrados 705.239 acidentes contra 720.629 em 2011. Houve uma pequena redução, mas o total continua acima dos 700 mil por ano, o que é ainda alarmante.
No Brasil, a cada sete benefícios concedidos por afastamento por doença relacionada ao trabalho, um é por acidente.
Alguns municípios do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Maranhão já estão aplicando a nova concessão do auxílio-doença. Segundo o INSS, as medidas foram tomadas depois de ações públicas contra a demora no atendimento.
Em Santa Catarina, por exemplo, quando a agenda dos peritos ultrapassar 45 dias, o segurado pode requerer o benefício apenas com um atestado médico.
Para Walcir, com as novas regras, as empresas ganham mais um instrumento para fragilizar ainda mais o sistema da CAT (Comunicação de Acidente do Trabalho) e desaparecer com as ocorrências de acidentes e doenças relacionadas com o trabalho, considerando o procedimento discriminatório patrocinado pelo INSS logo na porta de entrada do sistema previdenciário, tendo tratamento diferenciado para direitos iguais, previstos na Constituição Federal.
"O impacto social também é grande, as empresas garantem sua imagem no mercado, como empresas limpas, empresas risco zero, empresas sem acidentes. Desta forma, o próprio INSS fica impedido de entrar com ações regressivas, previstas em lei, que obriga as empresas que acidentam e adoecem a reembolsarem os cofres públicos, com a devolução do que foi pago em casos de acidentes do trabalho. Logo, quanto maior a subnotificação das ocorrências dos acidentes e doenças relacionadas ao trabalho, toda a sociedade perde com essa prática política. Aliás, nem todos perdem. As empresas ganham", destaca Walcyr.
Perda de direitos trabalhistas
A médica também aponta outro agravante, como a possível redução de direitos trabalhistas.
"Ao saber que pode receber o auxílio-doença previdenciário, de mesmo valor do auxílio-doença acidentário, sem passar por perícia, o trabalhador provavelmente preferiria abrir mão da sua condição de acidentado do trabalho a ter que solicitar a emissão da CAT pela empresa e esperar a perícia, correndo o risco de ter o benefício negado. Mas ao abdicar do caráter ocupacional de seu acidente ou adoecimento, o trabalhador deixa de ter o seu fundo de garantia do tempo de serviço (FGTS) depositado e não tem mais direito à estabilidade de um ano após o retorno ao trabalho", alerta.
A pesquisadora da Fundacentro escreveu um editorial na Revista Brasileira de Saúde Ocupacional (RBSO) sobre as possíveis mudanças no auxílio-doença.
Para ler o texto de Maeno acesse:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0303-76572012000100002&lng=pt&nrm=is
Fonte: Contraf-CUT