Novos presidentes de bancos públicos têm cabeça de banqueiros privados

Mesmo com ótimos resultados e papel crucial durante a crise, BB, Caixa e BNDES apanham do governo Bolsonaro na posse das novas diretorias

 

O ministro da Economia, Paulo Guedes, deu posse hoje (7) aos novos presidentes dos bancos públicos no governo de Jair Bolsonaro. Estrelas da festa, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), no entanto, foram muito criticados. Com origem no mercado bancário privado, Guedes afirmou que os novos dirigentes terão de “;fazer a coisa funcionar direito”; e eliminar associações “;perversas”; que considera ter ocorrido nos últimos anos. 

Responsáveis por defender o Brasil dos efeitos da crise global de 2008, proporcionando ao mercado interno o crédito negado nos bancos privados, as políticas de crédito das instituições federais foram classificadas por Guedes como “;desvirtuadas”;, por supostamente ajudarem empresas que tinham boa relação com os governos anteriores. “;Quando o crédito é estatizado, sobra menos para o resto do Brasil. Aí, os juros são absurdos”;, afirmou.

A representante dos funcionários no Conselho de Administração da Caixa, Maria Rita Serrano, rebate a tese de Guedes. Segundo ela, o ministro está defendendo a mentalidade dos bancos privados. “;O fato é que os bancos públicos foram grandes investidores no crédito tanto pessoa jurídica quanto pessoa física”;, afirma a bancária, coordenadora do Comitê em Defesa das Empresas Públicas.

“;Baixaram juros, ofertaram mais crédito e obrigaram os bancos privados a também baixar. Essa política anticíclica, que teve seu auge em 2008, minimizou a entrada do Brasil na crise mundial”;, diz Rita, reforçando: “;Guedes está criticando é essa política com a ótica do mesmo sistema financeiro privado que foi responsável pela crise global”;.

De acordo com dados do Banco Central, desde a crise de 2008 o crédito nos bancos públicos cresceu acima da média, chegando a R$ 1,67 trilhão em dezembro de 2017, de um total de R$ 3,09 trilhões.

Em uma década, a participação dos bancos públicos na concessão de crédito aumentou de 36% para 56%, enquanto a dos bancos privados nacionais caiu de 43% para 31% e a dos estrangeiros, de 21% para 13%.

O Banco do Brasil é líder absoluto no crédito ao agronegócio, com 60% de participação de mercado. O crédito imobiliário da Caixa representa 69% do mercado.

“;É óbvio que só os bancos públicos desempenham esse papel relevante, fundamental de mediar essa questão do mercado, de olhar os cidadãos, o investimento no país, o desenvolvimento, e não só o consumidor como os privados”;, avalia Rita Serrano.

Para ela, Guedes quer os preços desse mercado —; custos do dinheiro e das tarifas —; sob controle dos bancos privados, sem a concorrência do Estado por meio das instituições públicas. “;Os bancos privados sempre puderam fazer grandes investimentos no país, em habitação, agricultura. Nunca fizeram porque não tiveram interesse, já que o único objetivo é o lucro. Ou seja, com o enfraquecimento dos públicos, o mercado, o capital privado, se desvencilha de concorrentes incômodos. A população brasileira e a economia do país perdem, assim, instrumento importante de política pública.”;

A classe média será uma das prejudicadas. Segundo o novo presidente da Caixa, Pedro Guimarães, terá de pagar mais pela casa própria. “;Ou vai buscar (crédito) no Santander, no Bradesco, no Itaú. Na Caixa Econômica Federal, vai pagar juros maior que Minha Casa Minha Vida, certamente, e vai ser juros que vai ser de mercado. Caixa vai respeitar, acima de tudo, o mercado. Lei da oferta e da demanda.”;

gráfico bancos públicos

Quem são os novos presidentes

Antes da posse, o presidente Jair Bolsonaro comemorou, por intermédio da sua conta pessoal no Twitter, a abertura do que chama ser “;caixa-preta”; das instituições, como o BNDES. Paulo Guedes reforçou a mensagem, afirmando que operações “;danosas”; feitas no passado por meio desses bancos teriam trazido prejuízos à população.

No entanto, Joaquim Levy, que assumiu a presidência do BNDES, foi o ministro da Fazenda —; à qual está subordinado o banco —; no segundo mandato de Dilma Rousseff, de janeiro a dezembro de 2015, responsável pela política de ajuste fiscal com o objetivo de conter gastos públicos. Foi ainda secretário do Tesouro Nacional entre 2003 e 2006, durante o primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, e adjunto da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda, no ano 2000, no governo Fernando Henrique Cardoso.

De acordo com a Agência Brasil, Levy é engenheiro naval de formação, com doutorado em Economia da Universidade de Chicago (Estados Unidos), na qual também estudou Paulo Guedes. De 2010 e 2014, Levy foi diretor do Bradesco. Para assumir a presidência do BNDES, deixou a Diretoria Financeira do Banco Mundial.

Rubem Novaes assumiu a presidência do BB igualmente tecendo críticas e afirmando que as instituições têm a responsabilidade de reverter o quadro que o país viveu nos últimos anos. 

Também da Universidade de Chicago, atuou ao longo de todo o período de transição de governo ao lado da equipe econômica de Bolsonaro. No período, Novaes, que foi indicado para o cargo apenas em 22 de novembro, iniciou conversas com integrantes da atual estrutura do BB. O novo presidente do BB foi diretor do BNDES, professor da Fundação Getúlio Vargas e presidente do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae).

Durante a posse, o novo presidente da Caixa, Pedro Guimarães, anunciou que a instituição deverá vender participações em áreas como seguros e loterias, reforçar o financiamento imobiliário via mercado de capitais e investir em microcrédito a juros mais baixos.

Guimarães —; que segundo informa a revista CartaCapital é genro do empreiteiro Leo Pinheiro, delator da Operação Lava Jato que cotou a história do tríplex em Guarujá (SP) e pivô da prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva —; disse que deverá fazer uma revisão nas políticas de patrocínio e comunicação da Caixa, conforme orientação do governo, e que viajará pessoalmente aos estados para ouvir clientes e visitar comunidades carentes onde o banco atua.

O economista Pedro Guimarães trabalhou com Paulo Guedes quando ele ainda era sócio do banco BTG Pactual. Na equipe de transição de Bolsonaro, é um dos responsáveis por fazer levantamento das estatais a serem vendidas. Chegou a ser cotado para nova secretaria de privatizações, vinculada ao Ministério da Economia.

Descapitalização dos bancos públicos

A Caixa tem cerca de R$ 40 bilhões em dívidas sem prazo que, segundo Guimarães, serão liquidadas agora em quatro anos por meio da venda de participações em empresas de cartões, seguros e loterias. A venda, segundo ele, “;já começa agora”;.

O economista Gustavo Cavarzan, do Dieese, explica que essa dívida são recursos que o governo federal aportou na Caixa para o banco público pudesse continuar emprestando e cumprindo o acordo de Basileia. “;É um tipo de recurso que, em teoria, a Caixa não teria prazo para devolver ao Tesouro, mas agora é possível que seja usado como desculpa para abrir o capital das subsidiárias”;, como a venda  de operações de Loterias, Seguros, Cartões e Asset no caso da Caixa.

No BB deverá ser aberto o capital da BB DTVM , que opera na gestão de recursos e administração dos fundos de investimento dos clientes do banco e vendidas as participações em empresas como a Neoenergia, do banco Patagônia (Argentina) e do Banco Votorantim.

O BNDES começou a negociar a devolução desses recursos ao Tesouro ainda no governo Temer, na ordem de R$ 300 bilhões já pagos.

Para Rita Serrano, é necessário que as operações de devolução sejam mais bem esclarecidas. Ela questiona que, com a devolução dos aportes ao governo, os bancos ficarão descapitalizados para a concessão de crédito e isso pode afetar sua sustentabilidade. E destaca que já fazem repasse de seus dividendos ao governo, prestando serviços em importantes programas sociais. “;Caso o governo resolvesse criar uma estrutura própria para esses serviços ficaria muito mais caro do que usar a atual estrutura desses bancos.”;

 

Fonte: Rede Brasil Atual

 

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